Perdendo a fé nisso aqui

Sei que poderia ser chamado de covarde por escrever isto, mas não posso fazer de conta que não penso o que penso: não tenho coragem de ter filhos. Se uma vasectomia não fosse tão dolorida acho que já teria feito uma só para prevenir caso eu mude de ideia mais à frente. Também não encorajo ninguém a ter. Não sou contra ter filhos, acho maravilhoso, apenas não quero ter e não acho uma boa ideia ter (pelo menos não mais num mundo assim).
Ser pai é uma responsabilidade muito grande. Para mim, grande demais! Talvez se eu me casar eu ceda aos desejos de minha futura esposa, talvez até eu mesmo deseje muito. Não sei, são possibilidades. Mas no momento penso assim. Não teria coragem de botar uma filha no mundo para mais tarde, muito provavelmente, vê-la se vestindo e se insinuando como uma prostituta. Isso seria a morte para mim. Não conseguiria vê-la se destruindo no mundo; se enchendo de vaidades, futilidades e se tornando cada vez mais vazia. Também não aguentaria ver meu filho se perdendo no álcool ou nas drogas. Talvez se tornasse um homem mau caráter ou algo pior. A possibilidade de vê-lo se entregando à pornografia e cedendo às paixões desse mundo mal já me fazem tremer. Não, não. É demais para mim. Não faria isso com uma alminha tão preciosa: trazê-la à existência apenas para sofrer e ser tentada, ainda mais sendo cristão e sabendo dos riscos que a alma dela corre de ser condenada à danação eterna. Não, não. Meus filhos estão mais felizes não existindo. Onde quer que eles estejam não-existindo, certamente estão melhor.
Também sei que educando bem os filhos há uma grande chance de que eles nunca se desviem do bom caminho, mas...sempre há a possibilidade. Filho de pastor também se perde. Filho de crente também morre sem conhecer Deus, ou pior, odiando Deus. Se tivéssemos, por sermos cristãos, a garantia de que nossos filhos seriam salvos, não pensaria duas vezes em tê-los, mas como essa não é uma promessa, então prefiro me privar do prazer de ter filhos do que sofrer a dor de perdê-los para o mundo. Não existindo eles estão seguros da condenação, mas se vierem a esse mundo terão de passar pelo julgamento divino e prestar conta de cada palavra e cada ação. Não, não. É responsabilidade demais, e não digo isso por ter medo de responsabilidade, mas por ter medo do que meus filhos poderiam fazer com seu livre-arbítrio. Antes fosse que todo cristão tivesse seus filhos predestinados à salvação de uma maneira incondicional, assim como dizem os teimosos calvinistas.
O caminho é estreito e poucos acertam com ele, disse Jesus. E é bem por isso que não quero ter filhos. O caminho é estreito demais. Para mim, que já existo, é maravilhoso saber que há um caminho estreito que me tira desse mundo (a saber, Cristo) porque conheço meu coração e sei que quero segui-lo, mas não conheço o coração de quem ainda não existe, não sei quais serão suas vontades, fraquezas, personalidade, aversões e paixões, não posso garantir coisa alguma, nem mesmo se ensiná-lo o Evangelho desde pequeno. Dou graças a Deus por minha mãe ter me mostrado o caminho e por meus amigos terem me ensinado a percorrê-lo. Que bom que encontrei e fui encontrado por Jesus. Mas nas condições em que o mundo se encontra hoje não acho uma boa ideia ter filhos.
Ter filhos também pode ser uma vaidade. Se não for para dar a vida por eles e transmitir todo o amor que há em você, não tenha filhos. Se você ainda deseja ter desejos e pensar em você, não tenha filhos. De outra maneira seria sacanagem com a criança. Pois veja, uma criança não pede para nascer, portanto seria a maior sacanagem do universo invocar à existência uma alma para maltratá-la e negligenciá-la. Ela poderia dizer então, e com toda a razão, o que Jeremias disse “Maldito o dia em que nasci. Não seja bendito o dia em que me deu à luz minha mãe! Maldito o homem que deu as novas a meu pai, dizendo: Nasceu-te um filho!, alegrando-se com isso grandemente. [...] Por que não me matou Deus no ventre materno? Ou não permaneceu grávida perpetuamente? Por que saí do ventre materno tão-somente para ver trabalho e tristeza e para que se consumam de vergonha os meus dias? – (Jeremias 20.14-18)
Então se não for para dar a vida pelos filhos, não tenha filhos. Não creio que é certo ter filhos simplesmente porque se deseja ter. Creio que essa é a intenção errada. Isso seria ter filhos para satisfazer o desejo de tê-los. Creio que o atitude certa para ter filhos é essa: Há amor demais em mim e em minha esposa, precisamos dividi-lo com alguém. Esse amor transborda e inunda nossos arredores e todos que ali estão, portanto por que não temos um filho para ser o recipiente de tanto amor? Essa sim seria a atitude correta. Ou também: Já construímos nossa casa e nossas vidas, aproveitamos bem um ao outro, por que não agora vivermos os dois para outro ser, dando tudo que pudermos dar e sendo tudo o que devemos ser para ele? Agora: Meu desejo sempre foi ter um filho. Vamos ter um filho? Ora, isso para mim é egoísmo. Filhos não são para satisfazer e entreter, mas sim para criar e instruir. Se você não está pronto para isso, não tenha filhos. Se por acaso você tem filhos e ainda vive para si mesmo, acorde, seu filho corre perigo.
Por isso que ser pai é uma responsabilidade muito grande. Infelizmente ter filhos hoje em dia é algo arriscado, não temos mais as certezas, convicções e fé que tínhamos antigamente. O mundo está relativizado, erotizado, imoralizado e violento demais. As três mais importantes instituições da humanidade foram para o brejo: A família, a igreja e a escola. Essas três recebem ataques de todos os lados.
A família não existe mais, a igreja está uma palhaçada e a escola está marginalizada. A família foi aos poucos sendo divida e reestruturada. Hoje estudamos na psicologia os novos arranjos familiares: famílias com dois pais, onde um deles é a mãe. Família com duas mães, onde uma delas é o pai. E a criança? A criança que se dane, ela ainda não tem querer; ela não tem o direito de ter um pai se esse quiser ser uma mãe, ou de ter uma mãe quando essa quiser ser um pai. Acredito que quebrando a família quebra-se a imagem de Deus para o ser humano. Aprendemos que Deus é um e três, ao mesmo tempo que é composto, é individual. Digamos que Deus é individualmente coletivo, ou unicamente composto. E assim ao criar a raça humana cria Homem e Mulher, e quando esses dois se tornam uma carne, como fruto do seu amor geram outro ser. Homem, Mulher e Filhos. Quebrando essa instituição sagrada quebramos o plano e a imagem tripla-única de Deus para a raça humana. A família não é mais família há muito tempo. Em grande parte graças à tecnologia. Por que comer na mesa com pai e mãe? Coma na frente do computador. Por que tomar café da manhã com a esposa? Tome na frente da televisão. Por que gastar tempo e sair com o marido? Saia com amigas e vá ao salão se embelezar e depois pegar um cinema ou fazer compras. Para que gastar uma tarde de fim de semana juntos? Cada um que vá ao seu mundinho particular e se relacione com pessoas virtuais ou imaginárias.
Há mil e uma maneiras de não-ser família e apenas uma de ser. O que é mais fácil?
A igreja, bom, sobre ela não acho necessário escrever, apenas veja o que acontece. A igreja foi aos poucos sendo desmoralizada e difamada por aquilo que se denomina igreja mas que na verdade é sinagoga de satanás – ou circo na melhor das hipóteses. As poucas igrejas sérias que ainda existem – assumo que elas ainda existam mas que estejam escondidas e quietinhas por aí – não têm mais poder de influenciar a sociedade de uma maneira consistente – pelo menos no Brasil isso é verdade. Nossos jovens – inclusive eu – não querem mais ir à igreja, pois nada do que há lá é o que eles precisam. Precisamos de relacionamentos sérios e duradouros, mas os jovens estão superficiais demais para isso. Precisamos de sinceridade e compreensão, mas tudo que vemos é hipocrisia e ignorância. Precisamos de auxílio; de um exemplo a seguir, mas tudo que escutamos é “pode”, “não pode” e “é assim!”. Precisamos de mais seriedade e menos vaidade, mais pregação e menos música, mais oração e menos encontros, mais Bíblia e menos frases prontas. Precisamos que nos ensinem a pensar. Precisamos de amor de verdade. Infelizmente a estrutura de igreja que temos hoje no Brasil para mim é um empecilho para o Evangelho. Antes fosse inútil, mas não é, ela é muito útil, ela consegue destruir e escravizar muitas vidas; serve para tudo aquilo que é contrário à vida pulsante que Jesus ensinou. Não vejo mais por que ir à igreja institucional. Não, não. Prefiro ficar em casa ou ir às ruas conversar com alguém. Recentemente fui conversar com uns rockeiros à beira da praia, há tempo não me sentia tão amado por um completo estranho. Fui mais bem recebido por eles do que pelo pastor com quem fui conversar. Pelo menos eles me escutavam e se interessavam por quem eu era e não ficaram meia hora tentando me convencer a frequentar os cultos de domingo e tocar no louvor. O cristianismo sofreu ataques fortes dos ateus e das outras religiões, mas como muitos cristãos se recusam a pensar e se predem a chavões, os jovens, questionadores e inquisidores por natureza, desprezaram-no e foram atrás de outras filosofias de vida.
A escola está completamente marginalizada. Aqueles professores que são considerados bons, são nazistas, socialistas, libertinos, gays, machistas, feministas, hippies, etc. Tudo aquilo que serve de exemplo de perdição é o que os jovens consideram como qualidade num professor. Eu sei, eu sou professor. Quem prega e sustenta a libertinagem faz sucesso, já os que creem em valores imutáveis e conduta comportada recebem desprezo. Professor certinho é careta. Professor devasso é professor show. Eu sei, sou professor. Já tive aluno de tudo quanto é tipo, e menos da metade da minoria se deixa influenciar para o bem. Professor é guerreiro. Briga com o sistema e com a sociedade. Professor briga com ideias, e essa é a batalha mais difícil de ser vencida. A escola não ensina mais, apenas faz o aluno decorar. Não incentiva a aprender, apenas cobra a tarefa e comportamento em sala de aula. Não se importa em transmitir mais do que informação científica, contato que se assinale a alternativa correta, está bom. O objetivo da escola não é ensinar, e sim fazer o aluno passar no vestibular em primeiro lugar carregando o nome da escola no peito. As universidades se tornaram seminários de doutrinação cética e ateística. Os professores fazem questão de ridicularizar tudo que a religião representa. Tratam Deus como um mito e o ridicularizam ao máximo, eles vacinam o aluno contra qualquer possibilidade do cristianismo ser real. As universidades estão ensinando os alunos a escarnecerem de Deus em nome da razão.
Então sem família, sem igreja e sem escola, o mundo se encontra perdido em sua própria indiferença, incredulidade e tolice. O que seria do meu filho então? Não, não. Não quero ter filhos. Não acredito que as coisas melhorem. Que Deus nos ajude.
Guilherme Adriano

Comentários

Meu caro Guilherme,

Como anda a vida? Texto longo como um grito em meio ao mundo, como anda a peregrinação nesta terra estrangeira?

Grande abraço,
Ronaldo
Tenho uma irmã que costuma dizer "não sem batalha mas vitória em todas", não gosto de dizer isso, então digo "não sem batalha, mas continuo vivo".

Aparentemente pelo que estive vendo no noticiário sobre o tsunami do Japão, não estaremos por muito mais tempo peregrinando.

Abraço irmão.
Pois é, são as dores do parto, o Espírito e a Igreja gritam Maranata, vem Senhor Jesus.

Meu caro irmão, alegre-se Nele que é a razão de nossa esperança.

Grande abraço,
Ronaldo
Este comentário foi removido pelo autor.
Vanessa de Paula disse…
De fato, sempre que estou numa sala de aula, me sinto invadida... Alguns professores transbordam incredulidade... As vezes sinto até medo de ser atingida. Muito difícil essa caminhada. Mas que o Senhor nos ajude. Amém!
Day disse…
Engraçado..
Já pensei muito sobre isso; imaginar um ser no qual quero dar todo amor e cuidado, nascendo e vivendo nesse caos, é realmente assustador.

Mas ainda acho que o AMOR é maior.
E que a vida vale sim a pena.
E que também vale dar a vida por alguém "ensindo a guardar o caminho"; mesmo sabendo que o caminho se decide caminhar.

Abraço Guilherme.
Elaine Sabel disse…
Sempre pensei em não ter filhos. Em um primeiro momento, isto é, há alguns anos, pensava isso por não ter a certeza de que eu teria a capacidade de cuidar de um outro ser, de transmitir a ele uma mensagem de amor, de bondade, que eu fosse capaz de educá-lo e amá-lo acima de tudo.

Hoje sei que eu seria sim, capaz de fazer tudo isso, mas então percebo que não quero ver meu filho nesse mundo, não quero que ele presencie toda essa maldade, essa falta de fé. Eu creio que é meu dever poupá-lo disso tudo.

Quem sabe, se o ser humano conseguir enxergar todos os erros que comete, se arrepender e tentar mudar e, assim, tranformar esse planeta em um lugar digno de se viver, eu possa começar a pensar novamente em ser mão, enquanto isso, minha vontade fica só no pensamento.

Adorei seu blog. Com certeza lerei com calma e atenção todas as palavras.